A única certeza que se tem até hoje é que Gabriel a época com 17 anos não podia estar em uma festa de bebida liberada, destinada exclusivamente para maiores de 18 anos.
Há um ano, na madrugada de 7 de março de 2015, cerca de 4 mil pessoas festejavam em um sítio no Distrito de São José do Triunfo em Viçosa, o início do ano letivo da Universidade Federal de Viçosa. Gabriel Oliveira Maciel, de 17 anos, foi brutalmente espancado, morto com um tiro na nuca e desovado em uma vala na zona rural. O caso ainda não foi solucionado pela Polícia Civil e se arrasta com várias dúvidas e questionamentos da família do jovem.
Segundo o advogado Fabiano Florio, contratado pela família do jovem, os trabalhos de apuração não têm andado da forma que se esperava. A investigação está sendo prejudicada por perícias que se alongam, pedidos de afastamento de um delegado e recomendação do Ministério Público para que a Corregedoria-Geral da Polícia Civil acompanhasse o caso, o que gerou a abertura de uma sindicância pelo órgão fiscalizador da polícia.
Até hoje, não há indiciamento de nenhum acusado. Também há contradições entre o que foi apurado em interceptações telefônicas e depoimentos de alguns investigados.
“Estamos completando um ano de investigação. Há elementos consistentes para o inquérito apresentar conclusões, mas, nesse caso específico, a polícia deixou a desejar”, aponta Fabiano Florio. A demora em analisar o material genético coletado em um veículo com manchas de sangue, apreendido em julho, é um dos fatores que dificultaram o andamento do inquérito.
Só agora, oito meses depois da apreensão do carro, a Polícia Civil afirma que o laudo foi concluído e já se encontra nas mãos do delegado Moisés Albuquerque, atual responsável pela apuração do crime. Ele não comenta as investigações, pelo fato de o inquérito estar sob sigilo de Justiça. A perícia em uma arma apreendida com dois homens presos em Ponte Nova, em outubro, é outra questão técnica que se arrasta e atrasa a investigação.
Pelo menos dois depoimentos não batem com interceptações telefônicas, segundo fontes da investigação. São os relatos de Julia Mariano da Motta Floresta, de 20 anos, e da prima dela, Lethicia Gomes Floresta, de 19, que moravam juntas em Viçosa e afirmaram ter ligado incessantemente para Gabriel após tomarem conhecimento do sumiço do rapaz, o que não teria ficado provado.
Julia tinha um relacionamento amoroso com Gabriel e morava em Viçosa, onde fazia faculdade. Ela o convidou para ir à cidade participar da calourada e, diante da negativa da mãe e de outros parentes de Gabriel, chegou a ir à casa do adolescente em Ponte Nova pedir que a mãe do jovem o liberasse. O jovem garantiu à mãe que dormiria na casa das duas e voltaria para Ponte Nova na manhã de sábado, o que não aconteceu. Segundo a família, no dia da festa, ela ligou para a mãe de Gabriel, dizendo que eles não iriam mais, porque ela estava passando mal. Mas, eles acabaram indo.
As interceptações do celular usado por Gabriel indicam que, na verdade, ele fez uma ligação para Julia às 6h41 do dia 7, o que é confirmado pelo advogado que a representa. A chamada só foi descoberta pelas primas depois que elas acordaram. Outra chamada do celular de Gabriel foi feita para a mãe do rapaz, às 8h01.
As ligações feitas e recebidas pelo número de Gabriel indicam que a única pessoa que ligou incessantemente para o garoto foi a própria mãe, Sayonara Oliveira Maciel, de 53. Isso aconteceu justamente depois da chamada recebida do número do filho, em que ela só conseguiu ouvir um gemido e ficou desesperada. No sábado, ela participou da missa de um ano da morte de Gabriel, celebrada em uma escola de Ponte Nova.
“Não vi meu filho se formar, não vi meu filho se casar e nunca vou ter um neto. Hoje eu sou uma pessoa sem vontade de viver”, desabafa Sayonara, que trabalhava como autônoma e iniciou tratamento psiquiátrico depois do assassinato do filho. Levaram meu filho para a morte”, afirma.
Incerteza sobre horário
Até hoje há divergências sobre os horários em que o grupo de jovens saiu da festa, mas os principais depoimentos indicam que foi algo em torno das 3h30. Amiga de Julia, M. E. C. B., de 17, relatou que estava com o casal no momento da saída, quando percebeu uma discussão entre o adolescente e a namorada. Ela foi a última a ver os dois juntos e confirmou que Gabriel queria pagar a passagem da dupla no ônibus que os levaria de volta, mas só tinha dinheiro para um bilhete.
“Ele queria que ela ficasse com esse dinheiro e falou que ia atrás dos amigos pegar o resto. Nessa hora, eu até intervim e disse para eles não brigarem porque eu emprestaria o dinheiro. Ele garantiu que voltaria, mas falou que, se algum ônibus passasse, ela poderia ir”, afirma M. A garota diz que voltou espremida com Julia na porta de um ônibus sem Gabriel e se separou da amiga no momento em que chegou a seu destino. “Ela ficou com um casal que estava conversando e que ia descer perto dela”, completa.
Dali em diante, pelo menos dois conhecidos de Gabriel afirmam que o avistaram de madrugada caminhando pela rodovia de acesso à festa em São José do Triunfo, mas não viram mais nada que pudesse elucidar o caso. Outras pessoas também mencionaram a presença de um carro vermelho na estrada, sendo que uma delas cita que teve a impressão de ver uma pessoa no chão ao lado do carro. Foi com base nessas informações que a polícia chegou até o carro apreendido com manchas de sangue constatadas pela perícia de Viçosa.
O advogado Francisco Rodrigues da Cunha Neto, que representa Julia, confirma que a garota foi até Ponte Nova pedir à mãe de Gabriel que o deixasse ir a Viçosa e garante que ela não sabe de mais nada a partir do momento em que os dois se separaram na saída da festa. “No evento, ele dividiu o tempo entre ela e os amigos. Ela resolveu ir embora e ele disse que ia depois com os colegas. Daí pra frente ela declara que não viu mais nada”, afirma o advogado.