Um dos grandes desafios da atualidade está no que fazer com a quantidade de lixo eletrônico descartada em todo o mundo. Pelos cálculos do Programa para o Meio Ambiente da ONU (Pnuma), serão 50 milhões de toneladas somente este ano. A maioria do descarte ocorrerá de maneira e em locais inadequados, gerando ainda mais problemas ambientais e de saúde pública.
De olho na possibilidade de reduzir o impacto desse lixo, particularmente nos recursos hídricos, pesquisadores do programa de Pós-Graduação em Agroquímica, do Departamento de Química (DEQ) da UFV, vêm trabalhando uma tecnologia inédita de descontaminação ambiental. A partir da síntese de nanopartículas polimetálicas (com mais de um metal em sua composição) obtidas do resíduo de Placas de Circuito Impresso (PCI) de computadores, eles estão conseguindo degradar diferentes classes de poluentes.
O resultado é tão significativo que, há um ano, a equipe coordenada pela professora Renata Pereira Lopes Moreira entrou com um pedido de registro de patente no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). A síntese de nanopartículas polimetálicas abre, portanto, perspectiva para duas frentes de combate à poluição ambiental: a redução dos resíduos eletrônicos e a descontaminação dos solos e lençóis freáticos.
Embora a equipe também venha fazendo testes importantes com as nanopartículas polimetálicas para remover da água compostos poluentes emergentes, como agroquímicos e fármacos, o foco atual tem sido a degradação de corantes utilizados pela indústria têxtil, uma das mais poluentes do mundo. Esse, inclusive, é o objeto de estudo da doutoranda Mayra Aparecida Nascimento, orientada pela professora Renata e coorientada pelo professor André Fernando de Oliveira. Os testes que a pós-graduanda realizou até agora no Laboratório de Nanomateriais e Química Ambiental (Lanaqua) do DEQ indicaram uma remoção de 500 miligramas de corante por grama de nanomaterial. “Em alguns compostos estudados, a remoção é maior que a obtida com o carvão ativado, uma substância bastante utilizada para adsorção", explica Renata. Segundo ela, o cobre, que, basicamente, constitui a Placa de Circuito Impresso, tem efeito proeminente na remediação de poluentes.
A professora conta que, para a síntese das nanopartículas a partir das PCIs, é necessária uma digestão química prévia do material. Isso significa promover uma dissolução seletiva dos metais presentes na placa e uma posterior adição de reagentes redutores ao meio em pH adequado. No caso da pesquisa da Mayra, não foi preciso juntar placas dos computadores e retirar delas os metais. Em função de uma parceria com o professor Efraim Lázaro Reis, também do Departamento de Química, Mayra trabalhou com os licores (metais já extraídos da placa) cedidos por ele e pela sua ex-orientanda de doutorado, Odilaine Inácio de Carvalho Damasceno.
Vantagens
A professora da UFV ressalta que a degradação por metais de valência zero - também denominados como nanopartículas metálicas (com apenas um metal em sua composição) ou polimetálicas - tem sido considerada promissora no tratamento de resíduos, inclusive de corantes. Elas são capazes de degradar compostos tóxicos, convertendo-os em substâncias menos ou não tóxicas. Além disso, têm a vantagem de poder ser reutilizadas após os processos de degradação, mantendo sua eficiência.
Contudo, Renata Moreira chama a atenção para o fato de que, do ponto de vista de aplicação prática das nanopartículas, os procedimentos de produção utilizam apenas reagentes com grau analítico, isto é, dos sais dos metais de interesse com elevada pureza, o que encarece bastante o processo. No caso das nanopartículas polimetálicas obtidas com as pesquisas que vem orientando, as matérias-primas são os resíduos eletrônicos, que existem em grande quantidade nos lixões das cidades. Portanto, como destaca a professora, “os resíduos geram novos produtos com valor agregado, já que a ideia é utilizá-los na remediação de poluentes”.
Por enquanto, a equipe trabalha com quatro tipos de resíduos: placas de circuito impresso dos computadores, baterias de íon lítio, pilhas alcalinas e bateria de níquel-hidreto metálico. A intenção é produzir materiais que possam ser usados em diferentes estações de tratamento de efluentes. Para a indústria têxtil o produto já mostrou ser bastante promissor. A ideia da professora, que ingressou na UFV em 2013, é avançar nas pesquisas para degradar outros poluentes, antes que alcancem as águas residuais ou de abastecimento público. “É nesse sentido que desejamos seguir nossos estudos. Desejamos também nos mobilizar para que, no futuro, façamos toda a planta de recolhimento do lixo eletrônico. Mas esse é um sonho para ser viabilizado mais para frente”.
Adriana Passos – fotos: Daniel Sotto Maior
Divulgação Institucional