“Enfermagem: a vida por vidas”; texto discute sobre a profissão e entraves
27 de janeiro de 2023

Neste artigo de opinião, Luciano Piovesan discorre sobre a enfermagem e os embates que cercam esses profissionais da saúde.

O Brasil vivencia desde 04 de Agosto de 2022 uma discussão sobre a adoção do Piso Nacional da Enfermagem e de Técnicos e Auxiliares de Enfermagem. Nesta data foi aprovada a Lei nº 14.434 que institui o piso salarial nacional do Enfermeiro, do Técnico de Enfermagem, do Auxiliar de Enfermagem
e da Parteira.

Desde então, entre embates públicos que envolvem os três poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, além dos hospitais públicos, privados e outros nosocômios, assistimos a uma verdadeira enxurrada de notícias, informações e desinformações que levaram aos “desavisados de plantão” e àqueles pouco
afeitos a buscar os fatos reais, a acharem que o centro da discussão de fato é o Enfermeiro ou o Técnico de Enfermagem e seus “altos salários”.

Mas, assistindo às narrativas, aos noticiários, aos embates jurídicos e toda sorte de desinformações, ousei-me a tratar do tema sobre outra ótica: a do profissional e de todos nós, um dia pacientes! Inicialmente vamos buscar um pouco da história e relembrar aqui as emblemáticas figuras de Florence Nightingale e Ana Néri. Muitos nunca ouviram sequer falar de ambas, mas foram o marco da enfermagem moderna no mundo e no Brasil.

Florence Nightingale nasceu em 12 de maio de 1820 e foi uma reformadora social inglesa fundadora da enfermagem moderna. Ganhou destaque ao servir como chefe e treinadora de enfermeiras durante a Guerra da Crimeia, na qual organizou o atendimento aos soldados feridos e tem sua história de vida dedicada à enfermagem e valorização da profissão. Ana Néri (1814-1880) é considerada a pioneira da enfermagem no Brasil, tendo prestado serviços voluntários nos hospitais militares de Assunção, Corriente e Humaitá, durante a Guerra do Paraguai.

E o que ambas tem em comum: a luta pela enfermagem, pela qualidade de trabalho, pela valorização da profissão e de seus profissionais e a dedicação diuturna e abnegada pelo próximo: seus pacientes. Isto é a essencia da profissão da enfermagem: a dedicação diuturna e abnegada pelo próximo. A profissão tem origem milenar e data da época em que ser enfermeiro era uma referência a quem cuidava, protegia e nutria pessoas convalescentes, idosos e deficientes. Desde sua criação, a enfermagem vem formando profissionais em todo o mundo, comprometidos com a saúde e o bem-estar do
ser humano.

Mas ainda aqueles incrédulos poderiam questionar: mas só isso. Definitivamente não: são muitas as atribuições do enfermeiro e eles são os profissionais que estão na chamada “linha de frente” e assim sempre estiveram. Não precisamos ir longe para entender esta atuação na “linha de frente”, basta lembrar de guerras passadas e recentes; de atendimentos diários em ambulâncias e SAMU; da pandemia do COVID19; das campanhas de vacinação; das doenças raras; dos atendimentos especiais; dos cuidados de feridas, cicatrizes e da atenção à alma de seus pacientes com um simples “aperto de mão”.

Mas vamos além: os profissionais de enfermagem tem atribuições de gestão, sim de gestão em enfermagem, sendo cruciais para a operação dos centros de saúde públicos e privados, como gestão de pessoas coordenando não só outros enfermeiros, mas também os auxiliares e técnicos de enfermagem;
também são responsáveis por gestão de qualidade, checando e auditando os procedimentos hospitalares, garantindo o máximo de rigor em biossegurança e no atendimento aos pacientes; também trabalham com gestão de inovação em que buscam as medidas estratégicas e as implementações tecnológicas para facilitar o acesso às informações dos prontuários e aos bancos de dados dos
pacientes, assim como para melhorar o contato remoto das equipes multidisciplinares.

Na “linha de frente” a função do enfermeiro se concentra no atendimento ao público, no contato com as operadoras de saúde para liberação e avaliação de exames, procedimentos, consultas. São responsáveis pelo preparo dos pacientes para procedimentos cirúrgicos e não cirúrgicos; pela coleta de sangue
para avaliação bioquímica; pela triagem e encaminhamento dos cidadãos para serviços médicos ou multidisciplinares; pela supervisão e acompanhamento de pacientes internados. São ainda responsáveis pela administração de medicamentos, que ocorre tanto com aqueles pacientes internados e/ou em
observação, quanto com aqueles que procuram prontos-socorros para casos de urgência e emergência.

Na atuação com pesquisa conduzem estudos clínicos, éticos, jurídicos e de biossegurança que contribuam para a atualização, a modernização e a consolidação do exercício da enfermagem. E após décadas de luta pela valorização da profissão e do profissional da Enfermagem, finalmente surge a Lei do Piso Salarial, aprovada por unanimidade no Senado e por ampla maioria na Câmara, unindo parlamentares de diferentes correntes. Mas a implementação da lei foi suspensa desde Setembro do ano
passado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que alegou falta de clareza em relação às fontes de financiamento para que o piso seja implementado no Brasil, por uma decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso.

E neste embate entre poderes, decisões judiciais, leis e PEC’s, discursos e discussões, o piso salarial da Enfermagem segue sem previsão de ser pago amplamente, para todo o Brasil, mesmo estando a cinco meses após ser sancionado. Importante frisar que a luta dos profissionais de Enfermagem não se limita
apenas a salário, aliás uma justa e necessária implementação, mas também por qualidade de trabalho, ambientes adequados ao exercício da profissão, respeito de outros profissionais de saúde, estrutura física e equipamentos em condições mínimas de atuação profissional. E afirmo categoricamente: o problema da saúde no Brasil nunca foi falta de recursos, mas falta de gestão!!!

O Piso Salarial Nacional do Enfermeiro, do Técnico de Enfermagem, do Auxiliar de Enfermagem e da Parteira não é o problema, não faltam recursos: o centro da discussão dever ser “Gestão dos Recursos”, em todo sistema de saúde, nas três esferas de governo: federal, estadual e municipal. Mas nesta discussão, neste embate político-jurídico-midiático, é preciso que aqueles que atuam como gestores públicos, que atuam como diretores e membros de nosocômios e principalmente nós, a população, que um dia fomos e podemos ser pacientes, tenhamos a plena convicção que: “Enfermagem é vida
por nossas vidas!!!!!!”

Texto por Luciano Piovesan Leme

Luciano é Zootecnista, atuou como Gestor Público por mais de 20 anos e atua como Consultor em Gestão Pública. Imagem: Reprodução