Irmã gêmea de Madalena também viveu condições análogas à escravidão em São Miguel do Anta
30 de dezembro de 2020

Madalena Gordiano, 47, não foi a única a viver sob jugo da família Milagres Rigueira em São Miguel do Anta (MG). Em depoimento dado ao MPT (Ministério Público do Trabalho), o professor universitário Dalton César Milagres Rigueira disse que Filomena Gordiano, irmã gêmea de Madalena, "foi dada quando criança para Maria da Conceição", tia do professor universitário.

A reportagem do UOL teve acesso ao teor do depoimento, realizado no último dia 27 de novembro na cidade de Patos de Minas (MG), onde o professor universitário manteve Madalena sob custódia pelos últimos 14 anos.

Dalton, ao lado de sua mãe, Maria das Graças Milagres Rigueira, é investigado pela suspeita de ter mantido Madalena em regime análogo à escravidão durante quase quatro décadas. O processo está na fase de inquérito no MPT.

Filomena passou a morar com Maria da Conceição, tia de Dalton, aos oito anos de idade, no mesmo período em que Madalena foi viver com Maria das Graças. A irmã passou por situação de exploração semelhante, com exaustivas jornadas de trabalho sem remuneração, sem folga e que também não pôde concluir nem sequer o ensino fundamental.

O advogado Brian Epstein, que defende Dalton e família, foi procurado pelo UOL e não se manifestou. Em nota anterior, disse que ainda não teve acesso aos autos do processo. Também disse que os familiares "estão abalados pelo acontecimento e preferem se manter em silêncio".

Filho de Maria da Conceição, Cláudio Renato confirmou que Filomena viveu com sua mãe desde criança e que ela nunca teve carteira assinada, férias ou direitos trabalhistas, mas garante que não houve exploração. Disse também que Filomena não trabalhou quando criança e que passou a ter remuneração assim que começou a prestar serviços para a família.

Rotina sem descanso

Além de não ter concluído o Ensino Básico, Filomena também sofreu com longas jornadas de trabalho e nenhum tempo para lazer. "Ninguém via a Filomena na rua porque ela estava sempre trabalhando. Desde criança, ela já tinha de trabalhar para a família", disse uma das fontes ouvidas pela reportagem e que preferiu não ter o nome mencionado.

Seu caso é diferente do de Madalena, que viveu sob a guarda de Maria das Graças e Dalton por 38 anos. Além de ser remunerada nos últimos anos de trabalho, Filomena saiu da casa de Maria da Conceição por volta de 2010 para viver com o marido e o filho.

A relação com a ex-patroa é "amistosa". O filho Bruno, 28, ainda mora com a família de Maria da Conceição. Cláudio Renato garante que sua mãe sempre incentivou os estudos e pagou parte dos gastos da vida escolar do filho de Filomena, formado em História. Cláudio Renato também afirmou que a decisão de abandonar a escola partiu de Filomena, sem o apoio de Maria da Conceição.

Sobrinho de Filomena e Madalena, Carlos Gordiano, 34, decidiu se mudar para Uberlândia aos 14 anos de idade em busca de uma vida melhor.

"Mas isso lá (em São Miguel do Anta) é algo comum porque a cidade é muito pequena, muita gente não tem informação e não acha errado viver sob essa exploração. Eu saí da cidade quando fiz 14 anos porque eu já trabalhava e ganhava apenas R$ 4 por dia. Eu não queria isso para a minha vida", lamentou o sobrinho que está ansioso para rever a tia Madalena após 20 anos.

Em Uberaba desde que foi libertada da casa dos Milagres Rigueira no fim de novembro, Madalena aguarda a vacina contra a covid-19 para retornar a São Miguel. Enquanto isso, tem feito contatos diários com os irmãos que continuam em sua cidade natal.

Fonte: UOL.

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